Michelle, lembra quando fiz um poema onde toda frase começava com Gabriel?
Era um pouco irritante, não era? Mas você disse que ficou até bonito.
Michelle, é tanta coisa que me acontece..
Tanta coisa que me escorre dos dedos.
Eu choro. As lágrimas aparecem e é engraçado como vão embora, como num ralo aberto elas desaparecem, fogem de mim.
Hoje escrevo por não ter seguido seus conselhos. Ou por os ter seguido tão bem que só me resta confusão nesse coração que vai batendo bem, obrigada.
Escrevo porque partiram meu coração. Igual em filme de comédia romântica, só que a parte da comédia ainda tá faltando.
Escrevo porque deixei a cidade acabar comigo. "Não deixa São Paulo te engolir" você vivia falando e eu ria, colocava mais cerveja no seu copo e fazia um brinde.
E a danada me engoliu de jeito. Me pegou por trás mesmo, igual o tempo comeu aquela moça no poema que eu costumava recitar enquanto tomávamos café.
Quem tem olhos pra ver o tempo?
Soprando sulcos na pele?
Eu escrevo e lembro das noites em que andávamos pela avenida larga dessa cidade grande. Cidade tão pequena pro nosso peito vasto.
Entre prédios e saídas de incêndio, íamos de bar em bar, você com teu silêncio de mil textos e eu com minhas rimas baratas de amores que inventava. Falávamos dos amigos que já não víamos, das histórias que não tínhamos.
Entre risos gastos você gritava o garçom: "Ô moço, dois dedos mais no copo, por favor"
E sentadas na calçada, o céu cinza nos acolhia. Você conversava com alguém enquanto eu fazia outra poesia. Pegava um verso meu e encaixava no teu, acendia outro cigarro e sorria.
Mais uma cachaça na mesa do bar e então você me tirava do sério.
Jogava bolsa, carteira, sapato, olhava pra mesa do lado e pedia mais um trago.
Nós gostávamos dos dias de sol e nos deleitávamos com a madrugada. Você fazia graça com a natureza, chegava da noitada e meditava.
Eu só me arrastava pra te acompanhar. Teu passo era sem pressa. E o meu apressado que só. Então você me pedia pra ter calma que o mundo é um só.
Dizia que tudo bem e cambaleando rua abaixo, me entregava a chave na mão, gritava boa noite pro taxista e caia no portão.
Deitava e falava, abria as cortinas, fumava. Era Henrique, Paulo, Daniel...me contava de todos os caras que não souberam te amar.
Falava das aulas que ainda tínhamos que revisar, das equações que não sabíamos fazer e que sexo com tpm era bom (é não é que é?)
Dorme, pequena, dorme
que as luzes da nossa decoração de natal
continuam a brilhar.
De manhã preparava o café com teus olhos de ressaca, pegava o cigarro e colocava as flores no vaso.
"Quem gosta dá flor"
Ah, que saudade do teu abraço, do teu riso desenfreado
teu olhar desconfiado de criança
que tudo quer saber.
Ah, que saudade das nossas conversas
e do nosso sonho de encenar,
Das taças de vinho espalhadas pela casa,
dos livros que nunca lemos e
dos romances que nunca escrevemos.
Eu fico por aqui, sofrendo de amor, ou como nosso amigo André dizia, vivendo de amor. Porque quem ama vive. Vou leve, contando os passos pra te encontrar. Vou serena, fazendo versos pra te encantar.
Que Minas é longe pra diacho, mas ah...que saudade do teu abraço.
E um beijo no grande rei Arthur,
Com todo meu amor.