quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

DO DIA QUE O CAVALHEIRO SAMBOU



[[[ Rua estreita - Casa 05 Fundos ]]]

Adentrei a casa com olhos curiosos. Casa simples, pequena. Imãs desenhados na geladeira, uma coleção de xícaras coloridas, garrafas vazias em uma caixa no canto da cozinha.

Ouço o arranjo da música abraçando o quarto.
Meus olhos acompanham cada movimento do Cavalheiro. O desprender dos cachos do seu cabelo, suas costas nuas dançando sem preocupação, suas mãos balançando no ar, a boca desafiadora aberta em um sorriso com os dentes à mostra.
Seus movimentos ágeis são calculados, animalescos, livres. Os cabelos soltos emoldurando o rosto fino e incógnito
Percebi que não sentia necessidade de saber sobre o passado do Cavalheiro.
Quem era ou de onde veio, com quem cresceu e viveu, quais eram seus valores, seu signo, no que acreditava e buscava, o porquê da pequena cicatriz em seu ombro.
Nada disso tinha relevância.
Seu passado e futuro se fundiam num poço sem mistérios para mim.
Só o que eu via era o Cavalheiro à minha frente, de costas esguias e pele bronzeada, andando nu pela casa ao som de Caetano.
Seu quadril reagia ao som assim como minhas mãos reagiam ao seu toque felino.Como um leopardo negro ele avança sobre meu corpo, presa fácil que sou. A explosão de um gozo contido, rápido, libertador. Seu toque ricocheteava como o vento da janela aberta de um carro em movimento.
Seu olhar brilhava com qualquer coisa de ceticismo místico.Um semblante da insanidade ao avesso de Dalí com um toque da loucura amarela de Van Gogh.
Um animal selvagem que não podia ser domesticado.Com sua lucidez disfarçada, ele girava o tronco em seu próprio eixo.
As mãos acariciando o ar. Os olhos fechados. Cachos negros soltos. Um leopardo, um camaleão, um escorpião. Um Eros perdido na Terra.

Caetano cantava e o Cavalheiro sambava até seu corpo e o mundo ficar odara.


sexta-feira, 7 de novembro de 2014

PROFUNDA CALMARIA


Foto: Luisa Soares

O mar é calmo e leve como o vento,
me encontro sentada na beira
do deck com as ondas
preguiçosas indo de encontro
as pedrinhas onde afundo meus pés.

[Risadas próximas de um clown
que toca seu acordeão]

Meu âmago cheio de meu próprio ser
desliza tranquilo por
entre chakras e mantras
iluminados pela luz do luar.

Na relva ouço o canto dos pássaros
em uma bela sinfonia, como uma
orquestra bem ensaiada onde
o maestro é a mãe natureza.
Eles cantam em coro rodeando
o balbuciar sôfrego das
corujas e o tec tec tec
da minha máquina de escrever.

Vejo um verde que contêm todas
as cores do universo transpostas
em si

Tons rosados que desabrocham do
topo da folhagem,musgo marrom
esverdeado metamorfoseado nas
pedras que, esculpidas uma nas outras,
formam uma escadaria até o
infinito do céu.

Os insetos insistentes voando ao redor
da lâmpada acessa,
uma janela entreaberta
em que a cortina trepida, lânguida,
saudando o novo dia

A fumaça de um cigarro inexistente
se dissipando junto ao
sereno da manhã.

E o mar que continua ali
silencioso,inerte e só.
Imenso e completo
cheio de seu próprio vazio.
Imerso em sua solidão, e como um
gato selvagem observa o movimento
ao seu redor, com seus grandes olhos
de profundidade.

Olhos oblíquos do mar
que estão sempre a te fitar.


Florianópolis
Novembro/2014


domingo, 5 de outubro de 2014

PAULISTA


A noite estava muito
bonita
para não passar
na
Paulista.

realmente bonita

Tão limpa
tão viva
tão Paulista.

Meu coração ardia
e
acho que entendi
o que Kerouac dizia:
sobre estar em chamas.

Tudo se movia
colidia
tão Paulista
tão poesia.  
Out/ 2014

12:53


Oh, romances Shakespearianos
Não me abandonem
nunca!

Neste novo despertar
insólito.
Busco como fuga uma
aurora de sensações.

Intrépidas, ausentes e
presentes, aqui,
neste novo despertar.

Jan/2014

OS MESES


Quantos meses cabem
                        em um dezembro?
No meu
seis
no seu
coube meu coração.

No seu nós,
coube meu sou
           tão só.

Quantas estações cabem
                           em um dezembro?

No meu
quatro
no seu
coube meu jardim.

Coube uma avenida inteira
terminada em canção
a
contingência de
minhas alucinações.
                       
Coube uma casa
                   em 3x1

Coube flores
cor de anil
que
se cansaram de minhas
mãos.

e

Coube a antinomia
do meu eu.

Jan/2014

OS DIAS

Terça-feira
e uma gota
de chuva que molha
o meu telhado.
Suspiro.
Vou bem,
vou indo
e apesar de tudo
...
é
fácil mesmo não tá
mas relaxa,
que eu não desisto

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

HOJE ACORDEI COM UMA COISA AQUI NO PEITO




 Parecida com saudade.
Mas vai saber o que é
de verdade.

né?

Existe um abismo enorme
entre







nós.

Contarei uma novidade!
Eu estou bem
porém,

meus versos
agora
são inversos
aos versos
teus.

Mas vê se te acalma 
rapaz
senta ai e relaxa,
que meu coração
é grande
e

v
a
s
t
o

demais.


Agora vou lhe contar um
segredo
Tu nunca descobrirá
.de fato.
para quem é
que eu escrevo.


Haha

terça-feira, 9 de setembro de 2014

OUVE DOR

Estou à deriva, e por Deus
nunca me senti tão viva.

Como em uma TV pifada, minha cabeça parece não funcionar muito bem. Alguns fios parecem estar soltos, não se encaixam. E começo a pensar que nunca estiveram, de fato, unidos e em perfeito funcionamento.
Acordei sem ar e com o pulmão cheio de lágrimas que eu não soube como derramar.
Admito que me surpreendi. Achei que seria mais difícil levantar da cama. Que meus pés não iriam reagir, que minhas mãos não encontrariam a maçaneta..
Mas levantei, e fui bem.
Encarei os prédios com os olhos de uma criança, como se os visse pela primeira vez. Tão altos, irregulares e sem cor.
Tive medo.
Andei o caminho do metrô, desci do ônibus e caminhei. Apenas caminhei, sem parar.
Lembrei do Cartola, porque realmente em cada esquina caia um pouco minha vida. Será mesmo que já não sou o que eu era?
Se nem sei o que fui, como posso achar que mudei...
odeio reticências
Mas algo mudou.
O céu já não tem a mesma cor. Parece mais azul do que sempre foi.
O ar é pesado, mas entra leve. Meus pés caminham indecisos.
Minha mente parece um triturador. Faz um barulho tão grande que não me deixa ouvir nada além dela mesma.
Ouço tudo e não escuto nada. Meu corpo  parece uma rocha e ainda assim me sinto como se estivesse derretendo ante tudo.
De fato, o efeito do ácido já deve ter passado, penso eu. Então percebo que minha mente funciona como uma droga pesada que entra em abstinência o tempo todo.
Penso que tudo acabou, e a relação destrutiva ainda continua fazendo alguma coisa aqui dentro do peito.
Sinto-me sonolenta mas não quero dormir.
O fruto da minha agonia é não sentir nada. Não saber de nada. Nem para onde devo ir.

E não fazem nem dois dias que o inferno aconteceu, e eu me iludo achando que o tempo passou firme.
Mas ainda falta tanto...
Tenho medo, e estaria mentindo se dissesse o contrário.
Não sei o que será amanhã, e nem depois. Queria mesmo não dormir.
Engraçado que antes era só o que eu queria. Deitar e não acordar, porque a realidade batia sem dó. 
Não quero mais dormir.
Quero ficar no estado de não ser no qual me encontro. Simplesmente não existo. Meu corpo é só uma carcaça. No entanto, pesada demais para o vento carregar e muito leve para ficar onde está.
Minha cabeça é um caos. E dos grandes.
Sou impulsiva, insistente. Meu coração se apresenta em todos os poros do meu corpo. Grande demais e tão cheia que nem eu mesma caibo.
Eu não tô cabendo em mim e essa cidade se tornou pequena. Preciso ir e meus pés já não estão presos no chão. 
Escreverei meu livro. Ficará bacana, eu espero.
Talvez esteja mesmo enlouquecendo. Já não sigo uma linha de raciocínio.
Quem sabe existam outras opções. 

Procurarei ajuda.

Voltarei a dançar. Encontrarei um novo amor, visto que amar eu já aprendi.
Preciso escrever uma carta para o Vinicius, e acho que jamais escreverei.
Meu melhor amigo disse que estou perdendo a razão e que isso pode ser destrutivo. Meu vizinho me entupiu de boas energias, meus tios me bateram folhas e fizeram um banho com um cheiro esquisito.
Você vai ficar bem. Eles disseram.
Fiquei.
Mas não sei o que fazer com tudo isso.
Sou agora como um livro em branco. Pronto para ser escrito. E ansioso para tal.
Quero preencher essas paginas em branco com novos nomes e sorrisos.
Tem vezes que meu coração dispara sem motivo. Quase sempre quando lembro do Ipiranga. Dispara e dói o peito.
Tiraram o pino da granada que eu sou. E parece que já explodi. Mas o estardalhaço foi tão grande que a fumaça grudou na minha pele.
Não morrerei. Já morri naquele prédio.
Morri e nasceu qualquer coisa aqui, que não ouso reconhecer. E é isso.
Tenham paciência, por favor.
Sou agora uma criança que precisa descobrir todas as maravilhas deste mundo outra vez. No momento estou aprendendo a andar. Não esperem que minhas palavras sejam compreensíveis. 
Preciso reaprender tanta coisa. Ter alguma coerência é difícil.
Afinal, aconteceu tanta coisa e estou só enlouquecendo.
Logo tudo fica bem

Escrevo e escrevo e não me vejo em nada. Perdão, mas estou um pouco vazia.
Uma hora explico melhor, quem sabe.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014









Tudo que eu quero te falar


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é um vazio meu

Michelle, ma belle



Michelle, lembra quando fiz um poema onde toda frase começava com Gabriel?
Era um pouco irritante, não era? Mas você disse que ficou até bonito.

 Michelle, é tanta coisa que me acontece..
Tanta coisa que me escorre dos dedos.

Eu choro. As lágrimas aparecem e é engraçado como vão embora, como num ralo aberto elas desaparecem, fogem de mim.
Hoje escrevo por não ter seguido seus conselhos. Ou por os ter seguido tão bem que só me resta confusão nesse coração que vai batendo bem, obrigada.
Escrevo porque partiram meu coração. Igual em filme de comédia romântica, só que a parte da comédia ainda tá faltando.
Escrevo porque deixei a cidade acabar comigo. "Não deixa São Paulo te engolir" você vivia falando e eu ria, colocava mais cerveja no seu copo e fazia um brinde.
E a danada me engoliu de jeito. Me pegou por trás mesmo, igual o tempo comeu aquela moça no poema que eu costumava recitar enquanto tomávamos café.

Quem tem olhos pra ver o tempo?
Soprando sulcos na pele?

Eu escrevo e lembro das noites em que andávamos pela avenida larga dessa cidade grande. Cidade tão pequena pro nosso peito vasto.
Entre prédios e saídas de incêndio, íamos de bar em bar, você com teu silêncio de mil textos e eu com minhas rimas baratas de amores que inventava. Falávamos dos amigos que já não víamos, das histórias que não tínhamos.
Entre risos gastos você gritava o garçom: "Ô moço, dois dedos mais no copo, por favor"
E sentadas na calçada, o céu cinza nos acolhia. Você conversava com alguém enquanto eu fazia outra poesia. Pegava um verso meu e encaixava no teu, acendia outro cigarro e sorria.
Mais uma cachaça na mesa do bar e então você me tirava do sério.
Jogava bolsa, carteira, sapato, olhava pra mesa do lado e pedia mais um trago.
Nós gostávamos dos dias de sol e nos deleitávamos com a madrugada. Você fazia graça com a natureza, chegava da noitada e meditava.
Eu só me arrastava pra te acompanhar. Teu passo era sem pressa. E o meu apressado que só. Então você me pedia pra ter calma que o mundo é um só.
Dizia que tudo bem e cambaleando rua abaixo, me entregava a chave na mão, gritava boa noite pro taxista e caia no portão.
Deitava e falava, abria as cortinas, fumava. Era Henrique, Paulo, Daniel...me contava de todos os caras que não souberam te amar. 
Falava das aulas que ainda tínhamos que revisar, das equações que não sabíamos fazer e que sexo com tpm era bom (é não é que é?)

Dorme, pequena, dorme
que as luzes da nossa decoração de natal
continuam a brilhar.

De manhã preparava o café com teus olhos de ressaca, pegava o cigarro e colocava as flores no vaso.
"Quem gosta dá flor" 
Ah, que saudade do teu abraço, do teu riso desenfreado
teu olhar desconfiado de criança
que tudo quer saber.

Ah, que saudade das nossas conversas
e do nosso sonho de encenar,
Das taças de vinho espalhadas pela casa,
dos livros que nunca lemos e
dos romances que nunca escrevemos.

Eu fico por aqui, sofrendo de amor, ou como nosso amigo André dizia, vivendo de amor. Porque quem ama vive. Vou leve, contando os passos pra te encontrar. Vou serena, fazendo versos pra te encantar.

Que Minas é longe pra diacho, mas ah...que saudade do teu abraço.



E um beijo no grande rei Arthur,
Com todo meu amor.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

TEM COISA QUE SÓ SAI DA GENTE POR ESCRITO



Então ali estava eu. Parada atrás da faixa amarela do metrô, vendo minha imagem refletida nas portas de  segurança. Enquanto Cássia Eller cantava sobre malandragem na minha playlist, misturado ao barulho ambiente de conversas e passos apressados, abre e fecha de portas sincronizadas.
O que via no reflexo não era nada além do que já estava acostumada. Eu mesma.
Porém um detalhe me prendia a atenção. A camiseta que usava não era minha.
Em um ato de pressa havia pego a primeira camiseta solta no guarda-roupas. E não só a camiseta não era minha. O quarto, a cama e a casa também não eram.
Minha mesmo era só a pressa. E uma pontada de amor que crescia enquanto escutava uma respiração tranquila vinda do outro lado do quarto.
Meu mesmo, era o só o amor.
E agora estava ali parada, com aquela camiseta. Se me perguntassem de quem era, eu ensaiaria uma risada e não saberia responder.
"É do meu namorado."
Então essa palavra dançaria na minha boca, meio incerta, fazendo graça.
 Que coisa.
Encarei outra vez meu reflexo e como em um daqueles filmes onde você vê toda a sua vida passando na frente dos seus olhos, vi todos os meus versos desfilando ali.
Vi minhas poesias de tantos amores não vingados. Vi as páginas do meu livro sendo apagadas, uma a uma, ficando todas vazias. Por fim, vi todas as minhas expectativas se cruzando, dando as mãos e acenando.Tchau.
Das lembranças, mandei-as embora.
Das certezas, me desfaço de todas.
Das expectativas, fico com as que me enganaram.
Como nos meus sonhos ripongos, onde minha ideia de relacionamento seria um maluco de estrada que me pegaria pelas mãos e me levaria para conhecer as Cordilheiras. E seria parecido com o John Lennon.
Relacionamentos? Não sabia nem soletrar.
Dos monogâmicos achava uma chatice. Uma mentira construída nas bases morais da sociedade.
Essa coisa toda de um cuidar do outro, datas comemorativas, ciumes, finais de semana juntos, ligações, fotos bonitas, almoço na casa dos pais. Abominava todas.
Entendia mesmo era de drama. Dos romances que não davam certo, e que no fim, davam belos textos regados em boêmia.
Do amor, só achava bonito o que era livre para ir, e quem sabe, por simples insistência do destino voltar, ou não.
Achava bonito porque é mais fácil rimar amor com dor.
Engraçado que, agora, difícil mesmo é  reparar no teu sorriso e fingir que ele não fica mais afável junto com o meu.
Difícil é não achar graça na sua cara de sono, no seu quarto bagunçado e nos adesivos de adolescente colados no seu guarda-roupas.
Difícil mesmo, é negar que a tua melodia combina tanto com a minha.

E então ali estava eu. Confrontando meu reflexo em uma estação de metrô. As portas se abrem e o reflexo vai embora. Arrisco dizer, que junto com ele, minha insegurança e medo de sentir também.
Relacionamento, namoro, paixão, companheirismo. Não me importa o nome.
Porque se é mesmo esse tal de amor, que continue sendo leve, igual tuas mãos me despertando com o sol do meio dia.
E que seja tudo, menos poesia, porque como Cazuza já dizia, o amor na prática é sempre ao contrário.

terça-feira, 29 de julho de 2014

.


E logo eu,
que vivia cheia de temores
não hesitaria em trocar todas
as cores e poder
pintar na sua alma nua
a doçura e leveza de 
novos amores.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

HM


Uma calça de moletom cinza
que achei uma graça
ali dentro, tanta cor
mas na janela um dia escuro

Cabelo bagunçado, quarto desarrumado
e que bobagem a minha
de achar que nunca te
tão conheceria tão bem
meu bem

Uma estante cheia de livros
e as notas de um violão.
Será que teu coração batia
descompassado no
mesmo ritmo
 que o meu?


terça-feira, 22 de julho de 2014

REFAZER


Tem coisa que assusta a gente.
Tem medo que é só nosso
E cada um sabe do seu.
Reparando bem nos votos de aniversário na minha rede social, não sabia se ria ou se chorava. Engraçado mesmo é que a maioria deseja o mesmo desejo.
Que sua poesia não seque.
Ou que não deixe de poetizar.
E o que era poesia mesmo?
Que coisa, imagina só se eles soubessem que não sei mais fazer a poesia que gostam de ler. Estranho mesmo é não entender bem o porquê.

Por quê?
.
Dai decidi analisar. Minha vida andava muito cheia de nada. Tinha perdido todos meus pincéis e minha paleta de cores era um degradê de cinza e branco. Assim bem chato. Dos meus medos, decorei todos. Ora, e que chatice decorar os próprios medos, né.


DAS COISAS QUE ME DÃO MEDO
Eu queria mesmo era me refazer.
Cansei, assim fácil, de mim.
Mesmice boba essa de querer ser a gente o tempo todo.
Tem vezes que a gente acha que sabe de tudo.
Que o que sabe tá bom e o que não sabe tanto faz, deixa pra lá.
Coloquei um samba pra tocar e fui lá tentar fazer poesia.
Mas olha só, não consegui.
Engraçado que a gente fica assim, sem entender.
É que é tanta coisa pra saber.
né?

segunda-feira, 23 de junho de 2014

..NÓS DA CIDADE..

(Foto: Bárbara Fialho)

13:00. O celular apita com alguma notificação e só por isso desperto. De um pulo só, porque alguma coisa no tom dos raios de sol entrando pelas frestas da janela me dizem que já é tarde o suficiente. Uma só olhada na tela do celular e pronto. Droga! Tarde pra cacete. Levanto até com a cabeça tonta, tropeço nos brinquedos do quarto. Um campo minado. É isso que esse quarto parece. As malditas peças de lego por todo o chão.
No celular tantas mensagens que prefiro nem começar a ler. Todas da minha mãe, certeza. Pego blusa, cachecol, sapato.No espelho não gosto do que vejo e lembro do que minha amiga costumava dizer. "Mulher quando termina um relacionamento muda o cabelo, já que não dá pra mudar de cidade". Dou risada. Em questão de minutos me desfaço da roupa de dormir e estou pronta para ir em lugar nenhum.
"A chave está na caixa de correios". Sua mensagem foi enviada com sucesso.
Quanto tempo não mandava um sms. Agora com toda essa tecnologia é uma coisa já extinta. Quem é que manda sms hoje em dia? Ninguém. Só mesmo minha mãe.Gosto disso.
Saio e preciso de alguns segundos para me acostumar ao sol, mesmo ele quase não existindo.O que pega mesmo é a claridade. O céu parece confiável.Caminho devagar em direção ao ponto de ônibus e a avenida caminha junto, imóvel, silenciosa. Pessoas de verde e amarelo. Perucas, tintura no rosto. Gente feliz por um só dia. Depois volta tudo ao normal. O mesmo trânsito no horário das 18 horas, o mesmo caos no metrô, especialmente na linha amarela, o corredor de ônibus que de corredor não tem nada. Entro e desço no ponto seguinte, é que decido dar uma passadinha na Paulista. O dia acordou com qualquer coisa de diferente hoje. Eu até achei graça na insistência do sol que não estava lá. Respirei fundo. Puxei bem o ar que me faltava. E faltou por muito tempo mesmo. Percebi que tinha parado de respirar. E de andar. De sentir o sol-claridade. Parei até mesmo de acordar. Andava por ai sonambulando o tempo todo.Acho até engraçado usar um gerúndio para explicar minha falta de vida. Lembro de uma música do Gonzaguinha que meu avô escutava:


                                                                "Eu quero mais é me abrir
e que essa vida entre assim
como se fosse o sol
desvirginando a madrugada
quero sentir a dor dessa manhã
nascendo, rompendo, rasgando
tomando meu corpo e então
eu chorando, sofrendo
gostando, adorando, gritando"

Não sei mesmo por qual motivo lembrei dela. Acho que por conta do sol. E do excesso de gerúndio.A luz vermelha da porta pisca, indicando o lado certo do desembarque. As portas abrem, as pessoas descem, as portas fecham. Tudo sincronizado e as pernas começam a se misturar. Se você tiver uma imaginação fértil, e eu mesma nunca entendi essa frase, e andar olhando somente para o chão, vai perceber que a multidão de pernas formam variados desenhos, como em um quadro surrealista. E eu associo essa coisa de imaginação fértil com um solo adubado, e fico vendo terra na cabeça das pessoas. Algumas nascendo flores e outras nascendo nada. E até que faz sentido. A minha tem tanta merda que já pode nascer um jardim inteiro. Dois minutos. É o tempo que meus devaneios duram e o tempo que levo até a entrada da estação Consolação. No cruzamento entre a Augusta e a Paulista divago ainda mais. As pessoas atravessam apressadas, cada qual pensando em seu próprio destino. Coisa de quem mora na cidade ter pressa assim. Correr e correr só por correr. Na Paulista é mais fácil você ser atropelado por pessoas do que por carros. É bom ter cautela. E sempre neste cruzamento, e repito, somente neste, divago sobre a mesma coisa. São milhares de rostos e nenhum que eu procuro.Como é possível estar cercado de tanta gente e ainda assim se sentir só? Acontece o tempo todo então acendo um cigarro e deixo a fumaça sumir junto com o devaneio. Ando até a próxima estação e paro, olho pra cima, para os lados, até onde a visão alcança. Um céu tão bonito de inverno que até os prédios o abraçam. A cidade fica bonita vista de ponta cabeça. Mas meus pés estão bem presos no chão. Pego o metrô outra vez e cruzo a cidade que conheço bem. Faço um joguinho bobo de a cada estação lembrar de algum acontecimento. Brigadeiro,Ana Rosa, Santos Imigrantes, Sacomã. Cada qual com sua lembrança. Não volto pra casa, mas vou pra do vizinho. Toco a campainha e ele abre. De regata branca, com alguns furos, chinelo, um suéter gasto e o cabelo solto. Ele sorri. Coloca jazz enquanto passa o café. Me convida para ir até o Peru com ele como se me chamasse pra ir até a padaria da esquina. "Vou atravessar o deserto de sal e depois pegar a rota do Chile". Penso em tantas coisas. Como foi mesmo que conheci esse cara? Ah, é meu vizinho. Louco que só ele. Ouço as bombas então sei que o Brasil marcou um gol.Golaço daqueles. Vuvuzelas, crianças gritando, um coro entonando o hino. O vizinho pega um livro do Kerouac e lê para mim. Como se o mundo estivesse acabando e nada mais importasse. Anjos da Desolação. Ele lê um trecho que me faz entrar em transe. Nele, um homem está sentado de ponta cabeça na terra. No espaço mesmo, sentado no mundo como se estivesse sentado em uma daquelas bolas de ginástica, enxergando asas de anjo em todos. Kerouac é mesmo um santo, pensei. O dia acordou diferente, enfim. Me sacudindo, me lembrando de respirar. Despeço-me e volto o caminho para casa. Onde é mesmo minha casa? Nunca sei e a cada dia ela me parece diferente.Reparo nas pessoas na rua. Aqui no bairro todos andam devagar, sem pressa nenhuma, cansados de correr.Cansa estar em movimento.Nós, seres urbanos,cansamos de tudo.

Que engraçado é morar na cidade.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

AMORES DE PLURAL

Não me interessam os relacionamentos
A aliança, a casa dos pais
o almoço de domingo.

Eu gosto mesmo é das paixões.
Das rápidas e intensas
Das desenfreadas e impulsivas.

Dos amores que são
no plural.

Amores devem ser como
os de Vinicius de Moraes
ou
como o de Camões.

Amor como o
de Lusíadas.
oito mil versos rimados
terminados em sílabas unidas

Amores são tantos
são vários
e
são todos no plural.

SABE QUANDO VOCÊ NÃO SABE?



 Sei.

Ele disse, perdido, enquanto recolhia as garrafas vazias
tentando encontrar a si mesmo.
(nas entrelinhas)

Quero escrever tudo e gritar meu silêncio
Deixar a tristeza falar alto de tanta insistência
E eu sei que cada um vai ouvir só aquilo
que quiser.

Um tempo ai
me disseram que tudo seria fácil
Mas tudo o quê?
Basta escrever - eles disseram
Com a teimosia de antes e a graça de sempre
Movendo a solidão nos bares que frequenta

xxx

O metrô do alto tem o cheiro
do meu melhor amigo - Pensei.
Mas
meu caderno anda ficando cheio
de nada.
As folhas brancas ganharam, enfim.
E eu aqui, cheia de tudo.

Andando de bairro em bairro nas tardes de domingo
perdendo tempo demais tentando ganhar o tempo.
Umas poesias velhas em algum canto,
um livro do Bukowski 
que odiei.

Comecei a ter preguiça de tudo
De comer, escrever, conversar, fumar, trepar
Delicada mesmo nunca fui
então tá bom.
Dos poucos amigos que tinha, ignorava todos.
Primeira, segunda e terceira pessoa
misturava tudo e livro que é bom  não saia nada.

Queria fugir de São Paulo
ô cidadezinha sem graça
Mais mentirosa que eu.

Como é que a gente sabe quando uma coisa termina
e outra começa?
Sabe que eu não sei - Ouvi ele dizer.
E o medo, o que é que a gente faz com ele
mesmo?

Rapaz, vou te falar que eu tô com
um medo tão filha da puta
mas chega mais
porque
sei lá.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

DOR DE DENTE

Ouço a sirene da ambulância tocar ou seria do carro da polícia? Já não sei dizer. Vejo luzes do giroflex se misturar, às luzes da maçã de natal penduradas na minha janela.

Me dobro sobre a dor física pensando que tem me pregado uma peça indecorosa e ruidosa bruta.
Têm me enganado a tal ponto que já não sei diferenciar
a lamuria de uma dor fisiológica com a dor esquizofrênica da minha mente que tem se transformado em estrada sinuosa.
Tenho passado ruas escuras Tortuosas Tenho desistido de rimar por perceber que não acalenta mais minha dor.
Sinuosa minha mente anda ficando assim, com todo esse vai e vem.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

PIERROT


O bairro tem cheiro de pimentão
                               e dos verdes,
Eu disse enquanto te olhava
e você me mimava
                     Acendia um cigarro e dava um trago,
Deixava a fumaça se dissipar
enquanto me compadecia
                    com seu olhar.

Você falava sobre a Nouvelle Vague e
eu pintava Renoir
                E eu dizendo que tua pele branca
                combinava com seu olhar.

Teus olhos, uma contradição:
                 Vitória, bom dia meu amor!
Ignorei sua insistência,
Sua estupidez em me falar
                     de outra mulher.

Componha uma música para mim
                         meu pequeno Pierrot
Coloque nela o cheiro de pimentão
e esqueça do Arlequim.

Componha uma música para mim
meu pequeno
e
indeciso
                  Pierrot.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

LOS AMORES CIGANÕES


Eis o começo de uma nova situação;

A data: Faz diferença? Não lembro nem qual foi o meu almoço de hoje, acha mesmo que vou lembrar a data dos acontecimentos?
Dia desses me emprestaram um livro, e aliás fico me perguntando por que tudo sempre tem que começar com um livro. 
Bom, faz diferença? Ah faz, porque nesse livro tinha uma pergunta: "o amor acontece ou ele vira?" Lu, Luiz, Luiz Henrique, como preferia ser chamado, era o nome do personagem do livro. Nome não, pseudônimo. Como ele era um agiota, precisava de um nome melhor que o seu próprio. Pseudônimos. Tá ai uma coisa engraçada. O cara pra quem vou escrever essa 'historinha" também gosta de usar essa coisa babaca de pseudônimo. Franja. Não, não me perguntem se ele tem merda na cabeça. Perguntas óbvias deixemos para depois. Quem tem merda na cabeça sou eu mesmo. Franja. Ganhou esse apelido bacana no colegial. 
Ah, os tempos de colegial. São aqueles tempos que fizeram os seus pais, em um lapso de lucidez momentânea, sentirem vergonha por terem te colocado no mundo. E acredite, sem exceção de pais. Franja, vulgo, Daniel. Loiro, sardas, olhos cor de mel, sapato social, chapéu, suspensório e vendedor de cervejas. Nunca comeu doce de abóbora da vovó. Mas sua cerveja preferida é sabor abóbora. E sim, existe.
Daniel, que em alguma brincadeira sem graça do Sr. Destino, decidiu voltar para minha vida. Justo quando eu não acreditava mais em destino.Cada pessoa tem uma maneira diferente de descobrir que nutre um sentimento de afeto por outra. Em termos mais conhecidos (e juvenis) descobrir que gosta. Eu, como sempre, escolho a que me faz parecer uma idiota. 
xxxxx
Acendi o cigarro, dei umas duas tragadas, enquanto minha melhor amiga falava:
 " É...é. Esse cara é estranho"
 "Não fala assim"
 "Peculiar?" - arriscou, me olhando com desdém
"Peculiar" - concordei  "porra amanda, ele sempre foi o cara mais irritante"
 " hm" - assentiu com a cabeça, enquanto tirava a caixa de cigarros da minha mão.
 "E o mais chato"

 "E agora você fica enfiada no serviço dele, todos os dias, sempre arrumando uma desculpa barata pra passar lá"
"E daí, ele trabalha aqui do lado..." 
"Precisa de dois ônibus pra chegar" 
" Mas não leva nem 30 minutos! " - aquiesci, me sentindo intimidada Foi ai que vi os olhos dela brilhando. Mas aquele brilho que você vê chegando igual nuvem de chuva, vem bem de longe e quando se dá conta..fodeu. 
" Só podemos recorrer a uma pessoa" 
" Não, não, não! Eu jurei que nunca mais faria isso" - Amanda se limitou a me olhar com desinteresse, com seu ar vil e superior. Olhou para o telefone. "Não vou fazer isso..tá, uma pergunta não mata ninguém,né? "
Tocou duas vezes. Três. Na quarta xinguei minha amiga, mentalmente, de puta.
 "Alô?"
 " Oi..sou eu. É, pois é, outra vez"
 "Queriiiiiiiiida, tudo booom? A voz dela era tão irritante que já fez com quem me arrependesse -" é, bom, bom não tá né, mas tamô ai"

"Quem é o rapaz desta vez?? Aí não me diga que é aquele zedec, sei lá o que, outra vez né? "

 Estremeci. Vaca maldita, puta analfabeta. Por que tinha que citar o nome do ex, que nem ex direito era? Será que é pecado xingar uma cigana? Pode dar azar no amor. Li em algum lugar. Se bem que pior que tá, não fica. De repente essas frases clichés faziam tanto sentido.

" melch..ah rosa, não, não, não é ele" - Como assim "quem é o rapaz desta vez?" como se eu tivesse tantos que fosse difícil lembrar. Se bem que..melhor deixar pra lá. 

"Vamos lá! Relaxa, descruza as pernas, não contrai" 

Não, eu não estava ligando para uma parteira. Mas sim, pra única mulher do mundo que sabia de todos os meus romances mal resolvidos. Minha taróloga.


("você devia escrever com a mesma delicadeza que me conta as coisas" Ai eu aceitei a proposta.)

ROMANCE DÁ NO QUE FALAR




admirável público
eu não sei mais
 poemar
POETIZAR
De ruas passo, cambaleio
                 DE PASSO EM PASSO
o que mais dá visualização

a alegria de quem estava olhando
ô manoel manda a cerveja ai
 ROMANCE TERMINADO EM EL

Ele era boêmia, era um bom malandro
admitam  
gostam de me ver escrever daniel

O que tem esse nome?
Esquinas da Paulista
noite fria de um final de inverno    

                                                                                                                     O maldito era boêmia pura
 Inverno rima com inferno?

DAS paginas de um novo livro

ABS.TRAÇÃO


quinta-feira, 1 de maio de 2014

365 DIAS DE GABRIEL (éis)


Serei breve,

Existe poeta mais preguiçosa que eu? Deve existir sim mas o prêmio seria meu viu.
Eu comentei que iria postar os capítulos daquele meu primeiro livrinho que fala de Gabriel e tanto El que todos sempre perdem a conta, né? Pois bem, a preguiça me pegou e também eu sei que ninguém conta com toda a paciência do mundo pra ficar acessando aqui e lendo capitulo por capitulo.

E também eu gosto tanto dessa minha primeira experiência ~literária~ que seria um mimo saber que ele tá rodando por ai no computador, celular (e todas essas coisas tecnológicas) de vocês. Então ele está disponível em PDF e na íntegra, sempre quis falar isso, para quem quiser baixar, visualizar, dar opinião, rasgar, queimar ou entregar pra algum Gabriel etc.
Só pra lembrar, o PDF é o "original" ou seja, cheio de erros de concordância e português que não tive paciência de arrumar ainda, não esperem uma escrita como Drummond ou Bukowski, eu não tinha a menor ideia do que estava fazendo e olha..ainda nem tenho.

Só entrar no link abaixo e pronto!
365 Dias de Gabriel (éis)

E ah, já que você tá aqui, vou aproveitar pra contar uma novidade, uhul. Eu decidi que escrever só poesia não basta, tô me arriscando e escrevendo umas coisas por ai, uns livros que pretendo publicar, bacana né? Tô morrendo de medo, confesso, mas uma hora a gente precisa sair daquela famosa zona de conforto.

O primeiro deles é um livro de contos sobre a cidade de São Paulo, mais especificamente, sobre a Rua Augusta e alguns bairros por ai. A história é narrada através de cinco personagens que frequentam os bares de SP, traçando encontros e desencontros, conflitos e filosofias de buteco. Talvez, mas só talvez, fique pronto no final de Maio e eu também vou deixar ele disponível.

O segundo será uma biografia não ficcional de um cara, chamado Romualdo Bella, que foi um dos integrantes daquelas escuderias dos anos 60/70. Esse ainda é segredo e não tem previsão e pretendo publicar com editora e tudo. Puta desafio!

Bom, é isso.Aproveita também e dá uma olhadinha no blog, andei postando umas coisinhas rs
E se alguém souber de algum curso de "aprenda a ser breve" me avisa que não sou boa nisso.

DESDE SEMPRE FUI POETA



Desde sempre fui poeta e descobri
como é fácil ser estrela quando brilhar
é tudo que você menos quer.

Desde sempre fui poeta por insistência
do meu pai,
que me acordava todo dia com um disco
na vitrola
cantando e dizendo que o canto era bom.

Mas
não entendia por que é mesmo
que eu continuava no mesmo lugar
se me diziam sempre que se fosse
poeta eu poderia viajar.

Desde sempre fui
                         Mas fui o quê?
Fui um rosto entre milhões,
a sinfonia de uma não abstração
A rima, quase sempre esquecida,
de uma canção.

O não
e [é]
o
sim, misturados em mim
sem nenhum tipo de solução.

Um silvo claro que sai oscilando
em busca
de qualquer escuridão.

                          Eu sou
                          o que sou
                                        É pra ser então?
Desde sempre fui poeta
e isso porque não me foi
ofertada nenhuma outra opção.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

VERSOS DE UMA MENTE SÃ



Giovanna largou a arma na gaveta e voltou a trancá-la. Que patético!
Não podia acreditar que por um minuto sequer tinha cogitado a ideia de usá-la. Em sua mente havia sonhado com esse momento. Agora já tinha planejado data e hora, carregado a bateria da câmera e separado os instrumentos que precisaria.
Voltou a abrir a gaveta e pegou uma caderneta marrom e sua caneta de bico fino. Colocou as duas sobre a cômoda e trancou a gaveta novamente, não sem antes dar um ultima olhada na arma.

24 de maio de 2014
Pensamentos psicopatas rodavam em sua mente
Mente saudável que mentia saudosamente.
Poderia ser sociopata, psicopata e uma infinidade
De outras doenças da mente.

Um versinho para celebrar a noite. Giovanna versou em sua caderneta, como assinatura, desenhou o olho de André e a letra G. Na semana passada, ele havia dito que somente Giovanna conseguia desenhar seu olho com tamanha exatidão. Ela sorriu.
No canto da sala, André repousava com a cabeça encostada na parede, os braços pendiam sobre suas pernas e levemente o polegar encostava no rasgo que sua calça tinha, um pouco acima do joelho.
Aproximou-se dele e com calma tirou seu chapéu, deixando os cabelos loiros caírem sobre o rosto. Gostava deles assim, cobrindo parcialmente os olhos e a sobrancelha arqueada.

-Meu bem, fiz o café do modo como gosta. Duas doses de conhaque. Sente o cheiro? - Disse com um sorriso sádico nos lábios vermelhos.

Giovanna era magra e foi com dificuldade que conseguiu levantar André e o arrastar para a mesa da cozinha, sentando-o na cadeira de frente para a sua. Voltou a colocar o chapéu em sua cabeça, deixando o cabelo formar uma estranha ondulação, como ele sempre costumava fazer.
A pele de André agora exibia um tom mais pálido do que nunca. Era como uma pintura em branco, onde só se destacavam as veias de um verde quase cinza que chegavam a formar um mapa. As veias eram os rios.
                                                                                                                           .
                                                                                                 Em algum lugar, uma pinta vermelha

Mesmo sem vida, André continuava com aquele ar maravilhosamente depravado. Sua boca formava um sorriso tênue e vago. O cabelo era fino, de um loiro morto. Mesmo se vestisse seu melhor casaco branco, sapatos de bico fino marrom e penteasse os cabelos para trás, jamais conseguiria disfarçar aquela aparência perversa e decadente. Era como um anjo, mas dos caídos.
Sua camisa branca, agora manchada de sangue, proporcionava um ar mais atormentado, que combinava tão bem com ele. Era bonito como o sangue escuro combinava com o tom pálido de sua pele.

A pele, sempre a pele.

Ela era o motivo por André estar ali, naquela situação. E aqui cabe uma nota.
Giovanna não trancou a arma na gaveta por covardia. Não podia estragar sua obra perfurando sua pele com algo tão banal quanto uma arma. Preferiu a adaga alemã que André tinha lhe dado de presente de aniversário. Era afiada, reluzia com o mínimo sinal de luz. O golpe foi certeiro, direto no abdômen.
Se disparasse a arma estaria tudo acabado.
Prepararia um café com conhaque, sentaria no sofá e ligaria a TV. Esperaria até a manhã seguinte. E não seria preciso esperar muito, logo veria a si própria nos noticiários da manhã.
Manhã news, SBT manhã, SP no ar, seu rosto estamparia todos.
Qual seria a manchete?

“Mulher atira em ex companheiro por ciúmes”

Seria de dar pena. Um crime tão bonito submetido a uma manchete ridícula e barata daqueles jornais imundos e hipócritas.
Giovanna nunca sentiu ciumes de André. Nunca brigaram, nunca houve desentendimentos. Assim como sua melhores lembranças, seus melhores versos sempre foram dedicados à André.
O que nutria era visto como obsessão por seus amigos, os remédios que sua psicóloga receitava eram bons, tomava-os sempre antes do almoço. Mas ele não entendiam, nunca poderiam entender.
Giovanna não tinha nenhum problema, não tinha nada de anormal com sua mente, ela funcionava bem. Até melhor do que a de muita gente por ai.
Não, eles não podem entender.
Foi quando assistiu ao mais novo filme que retratava a vida de Ginsberg, seu poeta favorito, que tudo ficou claro. Tudo se acalmou.

"Algumas coisas, assim que as amamos 
se tornam nossas para sempre,
E se tentarmos deixá-las elas dão
a volta e regressam para nós.
Se tornam parte de quem somos
Ou destroem-nos."


Era a citação de que mais gostava. Escreveria em um pedaço de papel e deixaria junto ao corpo de André. Continuou observando a mancha de sangue que aumentava na camiseta dele, era de um tonalidade bonita. 
- Já teve vontade de matar alguém, só pra saber como é? - Sempre perguntou isso para André, e ele sorria, nunca respondia.

- Você sempre soube,querido. É tão culpado quanto eu.- André não respondeu, não poderia. Mas ainda assim o sorriso depravado continuava ali.
No caso das manchetes, Giovanna daria algo melhor para eles. De um crime banal faria uma obra de arte. A mesma adaga que sorveu os goles da vida de André serviria para encher de vida as tapeçarias da cidade. Pesquisou bastante. Dissecou livros antes de dissecar seu amor. A pele de André daria belos tapetes.

- Você sempre gostou dos meus pés e eu da sua pele. Ainda sou sua artista preferida? - Giovanna tomou o último gole do seu café que já estava frio, foi até o quarto e buscou a caderneta. Deixou o olhar se demorar no rosto de André.

Giovanna ficou ali absorta em seus pensamentos.
Era tão bonito conseguir ver poesia em tudo.

sábado, 19 de abril de 2014

ESTIVE PENSANDO

Eu estive pensando
em Van gogh e Theo, em sua orelha decepada
em sua mente desvairada
Eu estive pensando em ser um tapete, quaisquer tapetes saberiam dizer o quão fácil é ficar parado e ser lavado e pisoteado e dobrado
Eu estive pensando em qualquer coisa relacionada à América e em toda a sua métrica mas ficou tão chato que não caberia neste poema.
Eu estive pensando pensando e falando e reclamando e am[ando] Eu acho que ando ando amando.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

365 DIAS DE GABRIEL (éis)



Cap. 1
Apresentação de uma quase história


Essa é uma historinha engraçada. E mais engraçada ainda é a minha definição para “historinha”
Não é de amor, pode até ser que seja de afeto. Mas sabe aquela coisa de rir pra não chorar? É tipo aquelas historias que de tão tristes acabam sendo engraçadas. Mas que coisa, ainda assim não tô conseguindo definir bem sobre o que vou contar. Não é triste, porque não tem tristeza aqui. Tem o drama, que torna tudo mais aceitável. 
Aliás posso garantir aos senhores que drama é algo presente em 99,9% dessas linhas. Se bem que... Não é uma historia, eu bem queria que fosse. São apenas fatos desenrolados no dia a dia de uma vida entediante. Na verdade tudo começou com um livro ó: Monólogos sentimentais. Foi dai que eu percebi que monólogos é tudo que acontece na minha cabeça. O tempo todo.
Eu sempre tive essa mania esquisita de dialogar comigo mesma, sabe, com freqüência. Mas freqüência tipo o tempo todo. Estranho né? Não que eu não tivesse pessoas pra conversar, é claro que eu tinha.

Tinha?

Mas é que estranhamente os melhores conselhos do mundo eu mesma dava pra mim.
Que absurdo gente.
Isso chega a soar até um pouco narcisista da minha parte. Mas eu vou começar com uma palavra intrigante.

Projeção.

Eu até pesquisei melhor pra saber do que, exatamente, se trata. É que sabe, esse negócio de ter uma única palavra que pode ter vários significados sempre me deixou confusa.
Projeção: Mecanismo de defesa, onde os atributos pessoais de um indivíduo, sejam pensamentos inaceitáveis ou indesejados, sejam emoções de qualquer espécie são atribuídos a outra pessoa.
É mais ou menos você projetar seus desejos, sentimentos e pensamentos mais profundos em outra pessoa. Quase que uma carência exacerbada. Bom, eu vejo um pouco dessa forma.

Eis que um belo dia tinha um trecho assim:

 “O nome disso é projeção. Eu sou esse cara que se apaixona por um monte de gente, o tempo todo, mas eu juro que são coisas diferentes, de jeitos específicos. Amores dentro de mim são como meios de transporte, cada um tem o seu lugar – a água para os barcos, o céu para os aviões, as estradas para os carros”

E nossa, eu sou exatamente esse tipo de pessoa. Começou bem assim.

- Ele já me pertencia antes mesmo de eu pedir permissão. Só ele que não via isso.

O nome dele é Gabriel.

- Ele coloriu nosso romance com tinta verde. Da cor dos meus olhos. Foi assim que ele me conheceu, pintando meu nariz.

 O nome dele é Gabriel.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

GIOVANNA SABIA MESMO COMO GOSTAR



Eu gosto de você,
André dizia.
Giovanna sempre foi rápida em entender as coisas, mas
em matéria de amor sua nota era baixa.

Eu gosto de você - ele dizia, enquanto segurava seus dedos e 
Giovanna sempre  respondia o monólogo doce dele com um sorriso sincero.
                                                                     Monólogo sim.   
       Giovanna sempre deixava André falando sozinho. Não por não saber o que falar, tampouco por não
    gostar de conversar, mas sim porque ficava observando as linhas que se formavam nas sobrancelhas 
                             de André toda vez que ele ficava sem resposta. Achava-o tão bonito. 
  Quanto ao tal do gostar, preferia pensar de outro modo.
Do seu modo singular, gostar não bastava.

Eu gosto de você,
André dizia.

Giovanna não entendia, até se esforçava e ninguém podia dizer o contrário.
- Mas é que gostar não basta - pensava.
Giovanna gostava do seu chapéu listrado;
gostava da sua pele de papel;
gostava do modo como ele gesticulava com as mãos;
gostava das sobrancelhas arqueadas.
Acontece que, gostar dessas coisas era simples, complicado mesmo era definir
André só no "gostar"

Eu gosto de você,
André dizia.

Giovanna gostava dos amigos que tinha;
gostava de ir ao cinema;
gostava de conhecer gente nova;
gostava de música francesa e de tomar café;
gostava de descansar as mãos na água corrente
porque, estranhamente, isso lembrava André.
Giovanna gostava de tanta coisa

só não gostava de  gostar 
de André.

Giovanna não se importava com o
silêncio de André, com sua aparente
falta de atenção ou de interesse.
André nunca ligava ou perguntava como ela estava.
Em André, quase não sobrava tempo pra Giovanna.

[[Isso deveria incomodar qualquer mulher]]

Mas não incomodava Giovanna.
Ela não se importava com quem André saia, à que horas voltava pra casa
Quantos amores ele teve antes dela e se algum ainda o procurava.
Se tinham algo certo ou indefinido.
É que Giovanna tinham mesmo era preguiça de perguntar.

E insisto, que, não por não se preocupar
A verdade mesmo é que só Giovanna ainda não
entendia que essa sua falta de interesse
é que é gostar.